quinta-feira, setembro 14, 2006

Girassóis no Armário...

Há quem queira fazer das coisas mais do que isso, mais do que coisas. Há quem precise de reforçar a ideia para se sentir em pleno. Há quem precise dessa identidade global, dessa que realce aos olhos os sítios onde estão. Há no fundo uma necessidade de identificação, uma pura falta de pertença. Nas ruas as pessoas deambulam quase sempre com os olhos no chão. Falta de tempo? Falta de imaginação? Ou pura vontade de passar rápido? Mas depois chega-se aos locais e quer-se realçar a presença. Mesmo que passemos rápido pelas ruelas e não observemos o calceteiro, a mulher com o saco das compras, ou a loja dos tantos Xicos deste País, que vendem desde o pão aos candeeiros para a mesa-de-cabeceira. Então estava eu a ler um matutino, rindo com piadas reais e uma senhora com faro dos lados de Lisboa, interroga-me, “ – Sabe onde posso encontrar alguém que pinte em vidro ou madeira”. Pensei, e dei voltas à cabeça e nada me ocorreu. Mas a senhora citadina explicou-se melhor e disse: - “Eu já sei quem é o senhor que faz, não sei é onde fica”. Ai tudo se tornou claro. Contudo a mulher insistiu em dizer: “- Sabe é que tenho lá uma armário, mas queria dar-lhe um ar mais alentejano, mas rústico. Queria desenhar uns girassóis ou assim...Não sei se me compreende”, frisou. E adiantou que “agora tenho uma casa no Alentejo”, coisa fina nos dias que correm...para quem descansa das buzinas.
Pensei na resposta que lhe devia de dar. Tivesse eu dito e teria posto em causa a hospitalidade deste povo.
Apercebi-me, que a senhora não tinha ainda percebido, que não era necessário pintar os armários, para pertencer a esta alma. Que as verdadeiras casas rústicas o são por tradição e vivência e não por modernismo estético. Vi que a senhora ainda não tinha reparado, que aqui, a vida corre normal como em tantos outros sítios deste País. Não se dão ares alentejanos, porque o são em estado natural. E ai, no dia em que a senhora consiga perceber que aqui o que muda é que pode abrir a janela e ver girassóis reais sem estarem pintados no seu armário citadino, ai nesse dia, digo-lhe o que realmente pensei.

2 comentários:

Anónimo disse...

Há quem ainda ache que o mundo está dentro de uma caixa.Isso acontece porque o mundo dessas pessoas está impregnado de metal envenenado e de coisas superfluas.No mundo dessas pessoas,os sorrisos dão-se no natal,e sempre amarelos.
Adorei o texto,mesmo.
Beijinhos:)

Anónimo disse...

Adorei, está muito fixe.
Só podias ser tu a escrever o que todos observamos no dia a dia.
Beijinhos