terça-feira, dezembro 20, 2005

Folgo de ar...

Nas manhãs de Inverno sempre se julga que a frieza do tempo é mais fria que a despedida. No entanto, o tempo mau vai com a chegada da primavera, mas a dor de sentir alguém a ir-se fica entranhada pelos poros da pele. E enquanto as temperaturas desciam, eu ouvia apenas essa voz de mágoa num misto de medo. E eu ali a sentir que o ar não faltava só a quem estava preso a essa cama, mas a quem se movimentava e lamentava a minha frente. Não me é ninguém chegado apenas um conhecido de rua de há anos. Mas nunca eu me sentira tão próxima de alguém tão distante dos meus dias, da minha rotina e dos meus hábitos. Mesmo que ninguém lhe pergunta-se pela vizinha Maria, mulher calma e pacata amolgada por alguns cardos da vida, mas feliz nos mistos sabia que a situação se agravava, era o meu caso. Com os dias era inevitável apenas uma máquina lhe sustinha a respiração. E quem sustinha agora a respiração a este homem (ao vizinho Manuel) que sente a escapulir pelos dedos a companheira de uma vida…a dor de quem sente a partida sem dizer adeus, de quem se sente ao abandono da sua sorte madrasta. De quem já não tem muito a perder e afinal perde tudo num simples folgo de ar. Entre um suspiro e outro eu ouvia – E agora que vai ser de mim? Nunca a solidão me esteve tão vincada no corpo. Nunca o desespero de alguém me ecoou tão alto nos ouvidos . E eu imóvel sem sorrisos alheios com a vontade de esticar a mão, mas sem a proximidade suficiente para abraçar. E inconscientemente pedias-me a mim, e a quem tivesse ali que pedissem por ti e pela Maria. E ainda que não acredite e não seja apologista da eternidade hoje se pudesse era a tua Maria que a daria. E se me pedes eu rezo ainda que não me converta, para que essa dor não seja tão fria quantos estes dias.

1 comentário:

Anónimo disse...

O ultimo folgo que nos leva também, deixando-nos cá!Desesperante.
Beijinhos:/