domingo, julho 02, 2006

RAP...

Sol quente, tão quente que os poros mal respiram. O mesmo caminho de sempre, aquele que me leva de regresso a casa. Não tenho por hábito dar boleias a desconhecidos, no entanto ali estava ele debaixo de temperaturas elevadas. Não era propriamente um desconhecido, conhecia-o de vista, o suficiente para saber que não me faria mal. Mas encostei, fez uma cara desesperadamente de alívio, aguçou ao olhar e acho que ficou feliz por me ver. Logo aí, nesse instante não me arrependi de ter parado. Sentou-se e perguntou-me se podia abrir o vidro, calor a mais. Poucas palavras, um constrangimento de quem não tem muito assunto, mais da minha parte do que da dele. A sua história de vida eu sabia, embora que vagamente. E imaginava também o que ele estava a fazer naquele lugar. Mas, mesmo assim, para quebrar o silêncio lá fiz a primeira pergunta – Então agora estas por cá? Não sei se era bem isto que queria dizer, mas foi o que saiu – Sim, aqui estou melhor. Sabes, reduzi a metadona para 17, no princípio do tratamento estava em 70. Senti-o confiante no seu feito e a mim senti-me sem saber bem porque metia eu embaraços. Ele encarava melhor a situação do que eu e ainda bem, sabia lidar com ela. Mais uns longos minutos de silêncio e eu a absorver tudo o que ele me estava a proporcionar, essas coisas que fazem crescer. Do nada um pássaro planou sob o vidro do carro, uma sensação de liberdade perfeita, reparei que os seus olhos viajaram com ele, tentei imaginar o que lhe estaria a passar em mente, mas achei que foi somente o que passou na minha, leveza sem limites. Perguntou-me o que eu fazia, e pela primeira vez apresentamo-nos formalmente. Acho que ele ganhou confiança, a suficiente para me perguntar se eu gostava de RAP. Levaria mais uns minutos e o som do carro era RAP francês. Naquele momento as barreiras estavam quebradas, a partilha de uma música aproxima qualquer um. O resto da viagem foi feito sob este ritmo. Reparei que ele estava tão empenhado em absorver os sons que decidi não interromper. Chegamos ao destino final. Saiu e pegou-me na mão com o agradecimento mais sentido que me proferiram até hoje, dei-lhe a cassete de RAP e ele perguntou-me: - Não queres ficar com ela para ouvires melhor, depois dás-me. Mas achei que ela lhe faria melhor a ele do que a mim. Hoje, voltei a encontra-lo e levava os phones nos ouvidos, por certo que era RAP o que ia a ouvir, de longe acenou-me e fez-me adeus e agradeci-me infinitamente por ter parado nesse dia.

5 comentários:

Anónimo disse...

Há uma coisa que muitas pessoas ainda não entenderam: o facto de alguém ter um problema não faz desse alguém, necessariamente, um problema. Ainda bem que existe quem perceba isso, como tu percebes. Por vezes, basta um sorriso para mostrar a outra pessoa que não está sozinha no mundo, que pode contar, não só consigo mesmo, mas com os outros. Que a sua existência não perturba e que essa mesma existência é um bálsamo para a nossa. Faria o mesmo que tu. Pararia vezes sem conta só para que um sorriso ou um pássaro em liberdade pudessem mostrar que todos nós podemos também sorrir e voar. E aqueles que atirarem a primeira pedra, esses, que façam um exame de consciência e reflictam quantas vezes não terão errado e se gostariam de pagar com a castração da sua vida e da sua liberdade.
Espectacular este texto.
Adoro-te.
Beijos******

Anónimo disse...

"Virei a mesa do medo
E pensei
Que há mais para virar
Virei-me por dentro
Até despertar..."

Nem todos sabem dar o valor devido e merecido a quem é capaz de virar a mesa do medo. Se ele reparou que ainda havia sonhos no meio da sua dor, de certo mereceu e já merecia que alguém antes tivesse parado algures ao "sol quente". E quanto ao "coração do tamanho do mundo", se tivesse palavras para o retratar não seriam suficientes...


"E há uma canção
Que um dia aprendi
Eu hei-de cantá-la
A pensar em ti

Em qualquer lado
Onde quer que eu vá
Levo no corpo o desejo
De te abraçar
Em toda a parte
Onde quer que o sonho me leve
Hei-de lembra-me de ti"...

...e só espero que um dia se eu precisar me dês boleia também...!lool:P

beijoooss :*

Anónimo disse...

É por estas e tantas outras que não consigo resistir ao que es -divinal, simplicidade extrema e linda mas tão linda por fora e por dentro que até doi. bons actos so podem surgir de boas pessoas e olha que este mundo anda ao contrário como diz o outro. bjoka

Anónimo disse...

...se na altura m dessem boleia tb, ou ouvissem a msma musica k eu .ou simplesment me dessem assas pnao voar por caminhos sem liberdade,podes krer k era a tua boleia k eu aceitava!!beijao grande!as experiencias sao p kem ker aprender!!
e tu tas la em todas!!es muita á frente!!
Bruna!

Anónimo disse...

grandes actos :)

bjo*